Sem categoria

Pandemia, flexibilização do uso de armas e feminicídio

Trata-se de um dever estatal conferir proteção às mulheres

25 de março de 2021

Por Dora Cavalcanti, Paula Sion e Cristiane Costa*

Artigo publicado originalmente no Correio Popular

No apagar das luzes de 12 de fevereiro, em edição extra do Diário Oficial, o presidente Jair Bolsonaro editou quatro decretos flexibilizando as regras de aquisição de armas de fogo e munições no País.

Entre as medidas, ampliação de quatro para seis em relação ao número de armas que um cidadão pode possuir em território nacional, franqueando o porte simultâneo de duas armas por pessoa e excluindo da lista de produtos controlados pelo Comando do Exército projéteis de munição com calibres de até 12,7 mm.

Segundo o Planalto, as mudanças buscam desburocratizar os procedimentos de aquisição de arma de fogo no Brasil. Entretanto, a autoridade federal olvidou-se de ponderar os impactos que essa “desburocratização” pode causar para parcelas da população, como é o caso das mulheres em contexto de violência doméstica. Em um início de ano marcado pelo agravamento da pandemia do novo coronavírus, é alarmante que o governo central flexibilize o uso de armas de fogo, justamente em um período em que as medidas de isolamento social estão sendo retomadas, fazendo com que muitas mulheres tenham que ficar em casa, expostas a diversos tipos de violências e ameaças.

Conforme dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), os casos de feminicídio cresceram 22% em 12 estados brasileiros, entre março e abril de 2020. Já os números oficiais do governo federal apontam que em 2020 o país registrou 105.671 denúncias de violência contra a mulher recebidas pelo “Ligue 180”, o que representou cerca de 290 denúncia por dia. Desse total, 72% dizem respeito à violência em contexto doméstico.

Trata-se de um dever estatal conferir proteção às mulheres e, certamente, a facilitação da posse de armas pelos eventuais agressores não é a medida adequada para o cumprimento desse dever. Resta aguardar os índices no final do ano que se inicia.

Mas essa, infelizmente, não parece ser a preocupação de Bolsonaro. Em agosto do ano passado, o Ministério Público Federal ingressou com uma ação civil pública em razão de posturas desrespeitosas e declarações discriminatórias, proferidas pelo Presidente e ministros de seu governo contra as mulheres.

Na ocasião, a Procuradoria destacou que suas manifestações intoleráveis têm efeito “sobre a realidade social e persuasão do público, com potencial para reforçar estereótipos e posturas misóginas e discriminatórias, notadamente quando advindas de pessoas com poder de influência”.

E justamente em 8 de março, jornais noticiam a intenção do Presidente de se filiar ao Partido da Mulher Brasileira (PMB) para disputar a reeleição. Esperamos, realmente, que não encontre respaldo para dirigir o partido, o que seria uma verdadeira aberração. Afinal, em 28 de abril de 2020, após Jair Bolsonaro dizer que o Brasil não poderia ser um país do turismo gay e que “quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade”, o Partido declarou que a fala do Presidente, para além de incondizente com o cargo que ocupa, incentiva o “turismo sexual e reafirma o estereótipo de objetificação e coisificação que as mulheres têm em todo o mundo”.

*Dora Cavalcanti, Paula Sion e Cristiane Costa são advogadas do Cavalcanti, Sion & Salles Advogados

Notícias Relacionadas

Opinião

Testamentos durante o período de isolamento social

Elaboração de documento deve ser feita com critério para evitar questionamentos no futuro

Notícias

Movimento defende mais verbas para saúde

Assessora do Inesc diz que país enfrentará demanda reprimida no ano que vem