Opinião

Tema 788 do STF e o trânsito em julgado para a acusação anterior a 12/11/2020

Decisão sobre contagem da prescrição da pretensão executória merece atenção

18 de janeiro de 2024

justiça, advocacia

Por Mayra Mallofre Ribeiro Carrillo*

Artigo publicado originalmente na ConJur

Em estrita observância à literalidade do artigo 112, I, do Código Penal, sempre prevaleceu o entendimento jurisprudencial de que o termo inicial da contagem do prazo prescricional da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação.

No entanto, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento datado de 3/7/2023, nos autos do ARE 848.107/DF – Tema de Repercussão Geral 788, decidiu, por maioria, que o termo inicial para a contagem da prescrição da pretensão executória inicia-se com o trânsito em julgado da sentença condenatória para ambas as partes (acusação e defesa), momento em que nasce para o Estado a pretensão executória da pena.

A razão de decidir teve como fundamento o julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs) 43, 44 e 54, ocasião em que se firmou o entendimento de que a pena somente poderá ser executada após o trânsito em julgado da sentença condenatória para ambas as partes, em observância ao princípio da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal).

No raciocínio apresentado pela maioria dos ministros, não seria plausível que o marco inicial da contagem da prescrição da pretensão executória se desse a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória somente para a acusação, visto a impossibilidade de se exigir da acusação, a partir daquele momento, a execução da pena, quando ainda pendentes os recursos interpostos pela defesa às instâncias superiores.

Sem nos aprofundarmos na discussão que norteou a fixação do novo entendimento, é evidente que estamos diante de afrontas a princípios fundamentais ante a inovação interpretativa operada, já que modifica a determinação literal do artigo 112, I, do Código Penal, em verdadeira interpretação in malam partem aos acusados.

Ocorre, entretanto, que na mesma decisão, a Suprema Corte deu preponderância aos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, e modulou os efeitos da decisão, deixando expresso que o novo entendimento fixado se aplica aos casos: 1) nos quais a pena não tenha sido declarada extinta pela prescrição em qualquer tempo e grau de jurisdição; e 2) cujo trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido após 12/11/2020 (data do julgamento das ADCs nºs 43, 44 e 53).

Nas expressas e cirúrgicas palavras do ministro relator Dias Toffoli:

“I)        aos casos com a prescrição da pretensão executória reconhecida (independentemente do juízo, da data da prolação da decisão e da suspensão dos prazos pelo reconhecimento do tema de repercussão geral), a não aplicação do tema.

II)       Aos casos em que a questão objeto do tema ainda não havia sido decidida ou analisada:

A) com trânsito em julgado para a acusação ocorrido até 11.11.2020 (inclusive) a não aplicação do tema;

B) com trânsito em julgado para a acusação ocorrido após 11.11.2020 (a partir de 12.11.2020, inclusive) – a aplicação do tema”.

Daí porque o novo entendimento fixado no Tema 788 não se aplica aos casos com trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação ocorrido até 11/11/2020.

Aliás, embora recente o Tema 788, já existem precedentes do Superior Tribunal de Justiça em estrita observância à modulação dos efeitos da decisão, especialmente quanto à sua inaplicabilidade aos casos com trânsito em julgado para a acusação anterior a 12/11/2020. Por amostragem, colaciona-se:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. TERMO INICIAL. JULGAMENTO DO ARE N. 848.170 PELO STF (TEMA 778). TRÂNSITO EM JULGADO PARA AMBAS AS PARTES. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA TESE. TRÂNSITO EM JULGADO PARA A ACUSAÇÃO ANTERIOR À 12/11/2020. LAPSO PRESCRICIONAL SUPERADO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. AGRAVO PROVIDO.” (AgRg no REsp nº 2.017.881/PR, relator ministro Jesuíno Rissato, 6ª Turma, julgado em 12/9/2023, DJe de 15/9/2023.)

Nesse contexto, os operadores do Direito devem ficar atentos quanto à modulação dos efeitos da novel tese fixada pelo Plenário do STF, verificando, caso a caso, a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, especialmente nas hipóteses em que a prescrição da pretensão executória ainda não tenha sido decidida ou analisada e com sentença condenatória transitada para a acusação até 11/11/2020.

*Mayra Mallofre Ribeiro Carrillo é advogada criminalista especializada em Direito Penal Econômico e sócia do Damiani Advogados Associados.

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