Opinião

Ministério da Mulher deixou de executar 40% do orçamento em 2020

Suspensão das regras fiscais não melhorou desempenho da pasta

22 de fevereiro de 2021

Por Carmela Zigoni*

Artigo publicado originalmente no Estadão

Nem a suspensão das regras fiscais, nem a flexibilização das regras para contratos e licitações, medidas adotadas por causa da pandemia da Covid-19, foram capazes de melhorar o desempenho do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), que chegou ao fim do ano com um saldo de mais de R$ 225 milhões[1].

O MMFDH iniciou 2020 com R$ 394 milhões de recursos autorizados[2], uma quantia expressiva no contexto de cortes de gastos que vinham ocorrendo desde 2015. Com a pandemia, abriram-se créditos extraordinários para o Ministério, que chegou a ter R$ 582,5 milhões de orçamento disponível. Em um ano de aumento da violação de direitos de mulheres, indígenas, quilombolas, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência e idosos, deixou-se de executar 38,7% do orçamento da pasta[3]. Se retiramos os R$ 65,2 milhões de restos a pagar de anos anteriores pagos em 2020, o Ministério teria deixado de gastar 50% do recurso autorizado para 2020.

Para as políticas voltadas para as mulheres, dos R$ 120,4 milhões disponíveis, foram efetivamente pagos R$ 35,4 milhões, embora tenham sido empenhados R$ 117,4 milhões, recursos que serão de fato pagos somente a partir de 2021.  Do recurso pago em 2020 neste tema, mais da metade foi para pagamento do serviço Disque 180, canal telefônico para denúncias de violência, e R$ 5,8 milhões de restos a pagar de anos anteriores.

Para igualdade racial, foram executados R$ 1,3 milhão, porém, deste montante, R$ 1,2 milhões são recursos de restos a pagar de anos anteriores: do recurso autorizado de 2020, no valor de R$ 3,2 milhões, somente foram executados R$ 66 mil reais. Para a Ação 6040: Fomento ao Desenvolvimento Local para Comunidades Remanescentes de Quilombos e outras Comunidades Tradicionais nenhum recurso foi alocado.

A Ação 219Q: Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais não teve recurso alocado, embora parte da verba da Secretaria de Proteção Global possa ter sido destinada a este público, uma vez que abriga o Departamento de Promoção dos Direitos LGBT. A execução desta secretaria, que conta com três departamentos e 21 coordenações e coordena o Conselho Nacional de Direitos Humanos, foi de R$ 18 milhões em 2020.

A melhor execução foi do recurso específico para enfrentamento a Covid-19: foram autorizados R$ 137 milhões, e efetivamente gastos recursos superiores, no valor de R$ 210 milhões, a maior parte para idosos, advindos do Fundo Nacional do Idoso e executados por meio de convênios com instituições de longa permanência (cerca de R$ 160 milhões) e para indígenas, executados pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e Companhias Nacionais de Abastecimento (CONAB) nos Estados, cerca de R$ 42 milhões.

Ainda que tenha realizado ações importantes com os 60% do recurso que foi executado, é alto o valor do recurso empenhado e que não foi pago em 2020: são mais de R$ 200 milhões que não foram efetivamente gastos, em plena pandemia.  O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2021 prevê um corte de 77% dos recursos do MMFDH.

[1] Fonte: Portal Siga Brasil, acesso em 08 de fevereiro de 2021.

[2] Recursos referentes a despesas discricionárias, ou sejam excluem-se pagamento de pessoal e outras despesas administrativas e obrigatórias.

[3] Consideramos orçamento executado a soma dos recursos pagos e os restos a pagar pagos.

*Carmela Zigoni é doutora em Antropologia Social e assessora política do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos)

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