Opinião

Supremo julgará em repercussão geral o efeito confiscatório da multa tributária

Aplicação não pode estar em desacordo com os princípios previstos na Constituição

31 de março de 2022

Por Savio Nascimento da Silva e Guilherme Saraiva Grava*

Artigo publicado originalmente na ConJur

Embora o assunto seja antigo, permanece em aberto a discussão a respeito dos parâmetros para a aplicação de sanções tributárias, já que estas muitas vezes são fixadas em patamares desproporcionais e que extrapolam até mesmo o valor do tributo devido.

A controvérsia, porém, voltou à pauta do STF em fevereiro de 2022, quando a Corte reconheceu a repercussão geral no RE 1.335.293.

O recurso, indicado como repetitivo, discutirá no mérito o tema 1.195, assim definido: “Possibilidade de fixação de multa tributária punitiva, não qualificada, em montante superior a 100% do tributo devido”.

Como o próprio ministro relator Luiz Fux reconheceu, o embate segue sendo base de infinitos processos contra o Fisco, que insiste em aplicar penalidades elevadíssimas por infrações, ainda que não qualificadas por simulação, fraude ou conluio.

Sendo assim, o retorno do tema à pauta é uma novidade bem-vinda.

O próprio Supremo já decidiu, em diversas outras ocasiões, pelo limite máximo de 100% do valor do tributo como patamar para a multa punitiva.

É possível citar como exemplo a ADI 551/RJ, precedente no qual a Corte constatou que a desproporção entre a penalidade tributária aplicada e a infração cometida equivale a um verdadeiro confisco: “a desproporção entre o desrespeito à norma tributária e sua consequência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do contribuinte”.[1].

Já no RE nº 61.160/SP, o Tribunal sustentou que “o Judiciário pode excluir ou graduar a multa imposta pela autoridade administrativa[2]”, reforçando a relação de proporção entre a gravidade do ilícito e a punição eventualmente aplicada, bem como o papel interventor do Judiciário em casos como estes.

Diante desse cenário da jurisprudência do STF, que já é antiga, alguns Estados passaram a incorporar medidas para readequar suas legislações ao entendimento do Supremo a respeito da matéria.

Um bom exemplo disso ocorre no Estado do Pará, em que Lei Estadual nº 8.877/2019 alterou a disposição anterior da Lei Estadual nº 5.530/1989, que previa multa punitiva equivalente a até 210% sobre o valor do tributo devido.

Não é como têm atuado, porém, Estados como, por exemplo, São Paulo, que segue mantendo penalidades elevadas a despeito do que já decidiu o Supremo.

Por um lado, uma provável decisão do STF em favor dos contribuintes pode ser relevante não apenas para promover reajustes no plano legislativo, como o que já ocorreu no Pará, mas também uma reviravolta em relação a processos em curso que não tenham tido seu julgamento definitivo.

Por outro, é necessário manter certo grau de ceticismo, tendo em vista que a despeito das inúmeras decisões do STF no passado, o tema permanece atual e sem um desfecho definitivo.

De todo modo, ressalta-se que o que se espera da Corte não é o esvaziamento da multa tributária como instituto, tendo em vista a sua necessidade e utilidade no enforcement da legislação fiscal.

Porém, certo é que a aplicação dessa multa não pode se manter em desacordo com os princípios tributários previstos na Constituição Federal de 1988, de forma razoável e proporcional, harmonizando a relação entre o Fisco e o contribuinte.

[1] ADI 551, Relator(a): ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, j. em 24/10/2002, DJ 14-02-2003

[2] RE 61160, Relator(a): EVANDRO LINS, Segunda Turma, julgado em 19/03/1968, DJ 03-05-1968 PP-01495 EMENT VOL-00725-02 PP-00559

* Savio Nascimento da Silva é estagiário no escritório Diamantino Advogados Associados.

* Guilherme Saraiva Grava é advogado no escritório Diamantino Advogados Associados.

Notícias Relacionadas

Opinião

Equívoco da não indenização da posse na faixa de fronteira

Entendimento está sendo aplicado da forma mais danosa possível ao proprietário rural

Opinião

PCD: entenda a volta da isenção de IPI na compra de veículos

Não exigência da avaliação biopsicossocial, mesmo que momentânea, é positiva