Opinião

Receba! Aspectos jurídicos do caso do Cara da Luva de Pedreiro

Influenciadores digitais não estão preparados para questões jurídicas que surgem em consequência do sucesso

27 de junho de 2022

Por Victor Hugo Brito*

Artigo publicado originalmente na ConJur

O jargão “receba!” ganhou milhões de seguidores nas redes mundiais, fruto do trabalho de Iran de Santana Alves, conhecido como o Cara da Luva de Pedreiro, ou só Luva de Pedreiro.

Naturalmente, em consequência de sua estrondosa fama na internet, como Instagram e TikTok, “Luva” despertou interesse de grandes empresas no cenário global, além do empresário Allan Silva Jesus.

Curiosamente, segundo dados obtidos na Junta Comercial do Rio de Janeiro, a ASJ Holdings de Participações Ltda., empresa da qual Allan detém 100% de participação no capital social, foi constituída alguns dias antes do início das atividades da empresa “O Cara Da Luva De Pedreiro Produções Artísticas Spe Ltda.”, criada para explorar a imagem de Iran, na qual consta em seu quadro societário a empresa de Allan, Iran, e Victor Santana de Mello, também influencer.

De acordo com informações amplamente divulgadas em sites informativos e jornais, Iran detém 45% de participação na empresa, sendo outros 45% detidos pela ASJ, empresa de Allan, e 10% por Victor. Allan ainda figura na qualidade de administrador da empresa.

Ainda sem entrar no mérito da celebração de outros contratos entre Allan e Iran, do ponto de vista societário, se não existir um Acordo de Sócios, importante instrumento que regula as relações entre as partes, Luva de Pedreiro já teria um poder de decisão bastante restrito, de acordo com o Código Civil Brasileiro.

Por exemplo, as contas da administração da sociedade, nesse caso exercida por Allan, poderiam ser aprovadas sem o aval de Iran, bastando somente a aprovação da ASJ e de Victor, de acordo com os arts. 1.071 e 1.076, III, do Código Civil Brasileiro. Ainda na esfera da administração, a remuneração de Allan também poderia ser aprovada pela ASJ e Victor, nos termos do artigo 1.076, II, do CCB.

Não havendo limitações previstas no contrato social da empresa do Luva de Pedreiro, Allan, como seu administrador, teria plenos poderes para desenvolver as atividades empresariais, bem como representar a “Luva de Pedreiro Produções Artísticas” na celebração de contratos, instituições financeiras e órgãos públicos.

Por fim, a empresa também apresentou pedido de registro da marca nominativa “Receba””, principal jargão de Iran em suas redes sociais, no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). Ou seja, na prática, após o registro, ASJ e Victor também seriam donos da marca criada por Iran, obtendo lucros provenientes de sua exploração.

Existem diversas polêmicas envolvendo o Cara da Luva de Pedreiro e seus sócios, especialmente Allan, inclusive em relação a contratos com multas estratosféricas. Contudo, sem a análise de qualquer documento do caso em questão, não é possível avaliar medidas a serem tomadas por Iran neste momento, com o objetivo de reparar seu prejuízo e a celebração dos respectivos acordos.

Ocorre que, do ponto de vista societário, existem diversas alternativas a serem tomadas por Iran, tanto com o objetivo de destituir Allan do cargo de administrador da empresa, bem como até mesmo a sua exclusão da sociedade, tanto por via judicial quanto extrajudicial.

Algo incontestável a partir de tanta polêmica sobre esse caso, é o fato de que influenciadores digitais, em sua grande maioria, não estão preparados para as questões jurídicas que surgem em consequência de seu sucesso, muitas vezes meteóricos. Assim, tão importante quanto trabalhar sua imagem e marca, é fundamental que contratem uma assessoria jurídica de confiança e qualidade. Assim, minimizam as chances de terem problemas jurídicos ao longo do tempo, e podem focar especialmente em fazer o que sabem de melhor, que é viralizar nas redes sociais.

*Victor Hugo Brito é sócio de Direito Societário e Compliance do BBL Advogados.

Foto: Reprodução

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