Opinião

Negociação ganha força com alta do IGP-M

Pandemia trouxe desafios para relações comerciais entre locadores e locatários

23 de abril de 2021

Por Gabriela Alario e Andrea Navarro*

Artigo publicado originalmente na ConJur

A pandemia da Covid-19 trouxe uma série de desafios para as relações comerciais entre locadores e locatários. Nesse cenário, ficou evidente a importância da negociação extrajudicial para resolver conflitos gerados e potencializados pela pandemia. As negociações extrajudiciais dispensam a formalidade do Judiciário e trazem resultados rápidos — característica ainda mais valiosa durante as constantes mudanças trazidas pela pandemia, como o fechamento de estabelecimentos comerciais.

No início de 2020, com os primeiros decretos de lockdown, o fechamento do comércio impôs as primeiras conversas sobre a renegociação dos termos do contrato de aluguel entre os varejistas, locatários de mais de centenas de lojas, e os proprietários de imóveis.

Neste momento, relacionamentos já desgastados, somados a negociadores nem sempre hábeis, sentiram na pele as dificuldades de se alcançar o consenso em um momento de contenção financeira para os dois lados.

O cenário ficou ainda mais complicado quando, no segundo semestre de 2020, mais um desafio foi adicionado à busca da composição amigável entre locadores e locatários — desta vez, trazendo um desequilíbrio pró-locador. Em agosto, o IGP-M, índice de reajuste usualmente aplicado em contratos de aluguel, começaria a assustar com dois dígitos, acumulando 13% nos últimos 12 meses.

Em alguns casos, quando as tentativas de negociar não foram produtivas, o assunto foi parar na Justiça. Em São Paulo, a primeira instância chegou a conceder liminar para substituir temporariamente a aplicação do IGP-M pelo IPC, mas essa decisão teve seu efeito suspenso algumas semanas depois pela 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. Apesar das respostas provisórias, ainda não há uma opinião homogênea entre os advogados de Direito Imobiliário sobre como o Judiciário irá se posicionar.

Agora que completamos o primeiro ano de aniversário da pandemia, os decretos de lockdown estão de volta. O IGP-M acumulado dos últimos 12 meses chega em antes impensáveis 30% e os locadores, que chegaram a conceder descontos nos aluguéis em 2020, agora veem na alta do IGP-M uma forma de recuperar a receita perdida.

Nesse cenário, renegociar de forma extrajudicial os casos concretos tornou-se ainda mais necessário e um caminho mais eficiente do que esperar uma resposta do Judiciário. Para se ter uma ideia, uma das grandes empresas varejistas do nosso mercado, com mais de mil lojas em todo Brasil, conseguiu renovar 93% dos seus contratos de aluguel de forma amigável nos últimos quatro meses, substituindo o IGP-M por IPCA em 60% dos casos. Durante essas conversas, foi ainda possível reduzir o valor de locação em 20% dos casos, manter o valor em 79% e em 1% houve majoração.

A negociação nesses casos tem se mostrado altamente efetiva ao trazer a recuperação do reequilíbrio dos contratos de locação, sem as incertezas e a demora da reposta do Judiciário, além de ser a porta de entrada para a melhoria da relação entre locador e locatário. Sim, é possível negociar descontos e alteração de índice contratual preservando o relacionamento das partes — esse resultado depende, em grande parte, de negociadores habilidosos e de propostas equilibradas e não oportunistas.

 

*Gabriela Alario e Andrea Navarro são sócias da Alario Navarro – Soluções por Acordo.

 

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