Opinião

Estimular o intraempreendorismo é essencial para garantir a inovação

Ambiente criativo, flexível e participativo tem como consequência a retenção de talentos

30 de junho de 2021

Por Gilberto Santos*

Artigo publicado originalmente na ConJur

As organizações mudam o tempo todo e buscam inovações que possam lhes proporcionar diferenciais ou vantagens competitivas que garantam menos turbulências com as crises e variações do mercado, além da conquista da preferência dos clientes. Ter um olhar para dentro da organização e incentivar o potencial criativo dos colaboradores abre oportunidades para o desenvolvimento de inovações.

Nesse contexto, as organizações promovem cada vez mais o intraempreendedorismo para suprir suas necessidades de inovação contínua num mercado competitivo e globalizado.

O conceito central do intraempreendedorismo é promover ideias e incentivar os colaboradores a explorar seus perfis empreendedores dentro da empresa, valorizando a criatividade e soluções que surgem no ambiente interno. Dessa forma, o colaborador tem liberdade para agir como empreendedor e exercer, com autonomia, a criatividade para solucionar problemas e criar inovações.

Um bom exemplo de intraempreendedorismo é o Gmail do Google, que foi lançado em 1º de abril de 2004 e hoje é utilizado por milhões de usuários ao redor do mundo. Inicialmente era para ser apenas um serviço de webmail interno da empresa, utilizado entre os funcionários e idealizado por um projeto autônomo do engenheiro Paul Buchheit, que, após observar os principais concorrentes, à época, e as dificuldades que usuários tinham ao usar os serviços deles, inovou em muitos fatores: caixas de e-mails com mais espaço de armazenamento, sistema de buscas com muito mais precisão, visual fácil e intuitivo que fazem com que o Gmail seja praticamente indispensável nos dias de hoje.

Outro excelente exemplo inspirador é a 3M. Na empresa, que possui milhares de patentes registradas, os colaboradores são estimulados a investir 15% do seu tempo em projetos de inovação, empreendedorismo e criatividade. Como resultado tem-se uma lista de produtos inovadores: post-it, que dispensa apresentações; thinsulate, um isolante térmico para roupas; nexcare (tegaderm), linha de curativos transparentes utilizados para reduzir infecções da corrente sanguínea relacionadas ao cateter.

O que faz o colaborador intraempreender ao invés de empreender sozinho e criar sua própria empresa? Tanto o empreendedor quanto o intraempreendedor têm características em comum que os ajudam a viabilizar o desenvolvimento de projetos: proatividade, visão de negócio, autonomia, otimismo, liderança, negociação, perseverança e trabalho em equipe.

Ocorre que as pessoas com perfil mais arrojado e dispostas a assumir maiores riscos, provendo todos os fundos e investimentos necessários, tendem a empreender sozinhas, criando seu próprio negócio. De acordo com estudo realizado pela Associação Brasileira de Startups (Abstartups), o número de startups no país mais que triplicou entre os anos de 2015 e 2019, passando de 4.451 para 12.727 empresas no período.

Por outro lado, o perfil intraempreendedor costuma ser mais envolvido com a organização, é avesso a riscos, principalmente os financeiros, conta com estrutura e investimentos da empresa para viabilizar seus projetos mantendo sua remuneração, mas não deixa de assumir responsabilidades e ser líder. São inovadores e com propósitos de apresentar ideias novas, estratégias mais eficientes ou a criação de novos produtos.

O intraempreendedor não é necessariamente o colaborador que ocupa as principais posições na empresa; ao contrário, pode estar em qualquer posição. O importante é ter o melhor ambiente para o desenvolvimento de todo o potencial criativo e sustentável para a geração de inovações. Esse é o perfil profissional que as organizações com cultura de inovação constante buscam e quando se tem de um lado o ambiente propício nas organizações e do outro o profissional criativo, as possibilidades de inovação são incríveis.

Há muitos benefícios para os intraempreendedores e para as organizações nessa parceria que não podem ser deixados de lado pelos gestores na criação de seus planos estratégicos. A relação profissional com ambiente mais criativo, descontraído, flexível, participativo e social tem como consequência a retenção de talentos, o uso mais racional dos recursos e o desenvolvimento do capital intelectual, estando diretamente relacionadas a essa cultura organizacional onde todos tem papel importante.

De forma mais tangível, do ponto de vista financeiro, pode-se citar os benefícios apontados através da pesquisa da consultoria McKinsey publicada no recente artigo “Criatividade e lucratividade: Como empresas vencedoras transformam criatividade em crescimento e valor para o negócio”.

No artigo, a consultoria demonstra a relação do “Award Creativity Scorede (ACS)” — índice criado pela consultoria que mede a relação entre criatividade e performance, com o desempenho financeiro. A pesquisa mostra que empresas com baixo índice ACS têm menos chances de obter resultados financeiros acima da média.

Organizações que nasceram com a cultura de empoderar seus colaboradores encontram mais facilidade de endereçar seus projetos de inovação. A digitalização dos negócios e as novas gerações contribuem fortemente para que o intraempreendedorismo flua com maior facilidade nessas organizações.

No sentido oposto, as empresas que ainda mantêm a gestão totalmente centralizada, com o formato burocrático e vertical, precisam repensar esse modelo e promover a transformação de sua cultura para continuarem seus negócios dentro de novas perspectivas de mercado que são bem esclarecidas por Philip Kotler. Este, em sua obra “Marketing 4.0 do Tradicional ao Digital”, de 2017, afirma à página 30 que o mercado “está se tornando mais inclusivo. A mídia social elimina barreiras geográficas e demográficas, permitindo às pessoas se conectarem e se comunicarem, e, às empresas, inovar por meio da colaboração”.

Para isso são necessárias algumas ações que viabilizem e estimulem o ambiente para o intraempreendedor, tais como: desenvolver o pensamento coletivo, a capacitação e o engajamento dos colaboradores, a promoção e a geração de ideais, além do desenvolvimento de lideranças motivadoras.

*Gilberto Santos é diretor financeiro do escritório Fragata e Antunes Advogados, com MBA em Gestão Financeira, Auditoria e Controladoria pela FGV e MBA de Gestão Estratégica e Econômica de Negócios na FGV.

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