Opinião

Energia solar e a aprovação do PL nº 5.829

Marco Legal da Geração Distribuída tem o mérito de trazer segurança jurídica ao setor

28 de setembro de 2021

Por Antônia Bethonico Guerra Simoni*

Artigo publicado originalmente no Valor Econômico

No dia 18 de agosto, a Câmara dos Deputados aprovou o que tem se chamado de Marco Legal da Geração Distribuída no Brasil. É o Projeto de Lei (PL) nº 5.829, de relatoria do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) que, em 20 de setembro, foi distribuído ao plenário do Senado, tendo sido designado à relatoria do senador Marcos Rogério (DEM-RO). Uma vez aprovado pelos senadores, o PL será levado à sanção do presidente da República.

Um dos pontos amplamente debatidos, e que deve impactar de forma mais urgente o mercado da micro e minigeração distribuídas, refere-se à manutenção dos direitos dos consumidores que já aderiram ao sistema de compensação, antes da efetiva publicação da lei. Ou seja: quem já é beneficiado pelo sistema de compensação perde seus direitos quando o PL nº 5.829, com algumas condições menos vantajosas, de fato se transformar em lei?

Esse foi, inclusive, um dos pontos discutidos entre diversas entidades, incluindo a ABSolar e ABGD, que chegaram a um acordo uma semana antes da votação, no dia 11 de agosto, sobre o texto final que seria apresentado pelo Ministério de Minas e Energia à aprovação da Câmara. O Marco Legal da Geração Distribuída tem o mérito de trazer a segurança jurídica que o setor, antes regulado precipuamente apenas pela Resolução Normativa nº 482, da Aneel, tanto almejava.

Por outro lado, ele impõe regras por vezes mais restritivas ao consumidor. E, por isso, na negociação, foi considerado que os efeitos práticos de uma perda desses benefícios são vários e, claro, refletiriam diretamente sobre os cálculos de viabilidade e retorno financeiro de vários dos projetos já implantados no Brasil.

Esses reflexos ainda não são conhecidos com detalhes, já que o próprio PL nº 5.829 prevê um “encontro de contas” atribuído ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que, após ouvidos vários dos interessados, deverá estabelecer diretrizes para valorar custos e benefícios da micro e minigeração distribuída, e submetê-las à Aneel, para efetivamente calcular tais efeitos.

Mas reconhecendo os impactos sobre os projetos já existentes, o PL nº 5.829 garante aos consumidores que participam do sistema de compensação que seu regime seja mantido até o fim de 2045. Essa regra também vale para quem aderir depois de até 12 meses da entrada em vigor da lei e, em ambos os casos, ao final do prazo passarão a ser aplicáveis as regras então vigentes.

O direito é bastante abrangente porque o adquirente de um imóvel que já está no atual sistema de compensação, por exemplo, também aproveitaria as regras atuais. Assim, mesmo que o projeto tenha uma troca de titularidade, a aplicação da atual e mais benéfica regra permanece.

Por outro lado, o direito de se manter no atual regime será perdido pelo consumidor que encerrar a contratação com a distribuidora, ou por aquele que cometer irregularidade no sistema de distribuição, e também por quem ampliar seu sistema – caso em que as novas regras passam a valer apenas para a parte ampliada, e a parte original do projeto continuará a ser regida pelas atuais regras.

Ressalte-se que a manutenção dos direitos do sistema atual se aplica ao consumidor que, dentro do prazo estipulado pela lei, protocolar sua solicitação de acesso. Apenas para lembrar, a solicitação de acesso é o requerimento formal à distribuidora, solicitando a conexão ao sistema de distribuição de energia.

Outra questão interessante é que, como outros dispositivos da nova lei entrarão em vigor desde sua publicação, quem passar a integrar o sistema de compensação depois da data de sua publicação, mas antes dos 12 meses, embora aproveite das atuais normas, deverá prestar uma garantia de fiel cumprimento do projeto. Essa exigência se aplica aos novos projetos de minigeração distribuída que não sejam explorados por meio de consórcio, cooperativa, ou empreendimento de múltiplas unidades consumidoras, e seu valor depende da potência instalada do sistema.

O PL nº 5.829 ficou bastante tempo na pauta de votação da Câmara dos Deputados, e sua aprovação – que foi praticamente unânime – representou enorme avanço da questão, principalmente por ter sido fruto de acordo entre os partidos. Então, ao ser levado à votação pelo Senado, ele está em vias de ser concluído, e de efetivamente se materializar em lei.

Com isso, o que se tem visto é uma urgência cada vez maior dos consumidores e empresas atuantes na área em implantar sistemas de geração distribuída em prazo hábil a se beneficiar das atuais regras. Essa urgência deve aquecer ainda mais o setor, que já tem forte movimento com a crise energética que o Brasil vem enfrentando.

No atual contexto, todo o país procura soluções de curto prazo para afastar o “fantasma” do apagão, e busca medidas que a médio e longo prazo possam atenuar crises futuras, ao mesmo tempo que o consumidor, de forma independente, examina formas de minorar os impactos dessa crise energética. Com isso, é inevitável reconhecer que a energia fotovoltaica é uma das soluções bastante eficazes que se apresenta nos dois contextos: se em termos de estrutura, a importância da energia fotovoltaica como forma de diversificação da matriz energética nacional é inegável e urgente, em termos particulares, o consumidor, então, tem a chance de aproveitar uma janela de oportunidade com término iminente e, ao se antecipar nos projetos, aproveitar de um regime mais benéfico por mais de duas décadas, o que poderá potencializar o retorno financeiro do sistema de compensação de energia.

Antônia Bethonico Guerra Simoni é especialista em Direito Empresarial, advogada no Chenut Oliveira Santiago Advogados

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