Opinião

A relação do compliance na jornada de trabalho 4×3

Modelo vem ganhando adeptos de diversos ramos da indústria

18 de abril de 2022

Por Gabriela Diehl

O modelo tradicional que conhecemos em relação à jornada de trabalho é aquele em que se trabalha em média cinco dias na semana e folga dois. Este modelo trazido por Henry Ford há tantos anos foi considerado inovador para a época, mas hoje há uma nova forma de jornada de trabalho: a jornada 4×3.

A jornada 4×3 consiste em trabalhar quatro dias na semana e folgar três. O modelo vem ganhando adeptos de diversos ramos da indústria, sendo que já foi testado pela Zeedog e pela Microsoft.

A primeira dúvida que pode surgir a mente é: esse modelo é autorizado no Brasil?

Felizmente, sim, o modelo é aceito no Brasil. A CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas não dispõe de nenhuma vedação para o modelo de jornada proposto, bem como não possui um mínimo de horas para se trabalhar. A CLT dispõe apenas de limites de horas para trabalho, o que hoje é caracterizado por 44 horas semanais.

Dessa forma, o empregador pode se desejar contratar funcionários para a jornada 4×3, sendo que nesse caso o salário pode ser proporcional aos dias trabalhados quando em comparação com outros funcionários no mesmo cargo e que trabalham no modelo 5×2.

O que é importante apontar é que caso haja redução da jornada de trabalho de colaboradores da empresa (ou seja, uma mudança de jornada de 5×2 para 4×3) e caso o empregador deseje reduzir a compensação salarial do colaborador para constar como proporcional em relação as horas trabalhadas, tal situação somente é possível com a anuência do sindicato da categoria dos colaboradores.

Por outro lado, se o empregador deseja apenas reduzir a jornada de trabalho sem reduzir o salário, não há qualquer vedação para a prática.

Outro ponto de atenção é o descanso interjornada, ou seja, o descanso entre dois dias de trabalho. Segundo o art. 66 da CLT, é necessário que o colaborador tenha 11 horas consecutivas de descanso entre uma jornada de trabalho e outra (o disposto aqui não se aplica para plantonistas e outras profissões em que há autorização legal para diminuição de horas de interjornada).

A redução da jornada de trabalho não significa que haverá menos trabalho em termos de quantidade de tarefas a serem feitas, mas significa sim dedicar um foco maior para as atividades pendentes, de forma que os quatro dias implicam em dias em que se tem a concentração total no trabalho.

O sucesso de uma jornada 4×3 está, então, diretamente condicionada ao grau de dedicação e foco que os colaboradores possuem no trabalho.

Dessa forma, tendo em vista que o compliance auxilia no desenvolvimento de uma cultura ética empresarial, além de auxiliar no comprometimento de colaboradores com os valores empresariais, o compliance tem um papel significativo no sucesso da jornada 4×3.

O compliance deve atuar junto com o setor de Recursos Humanos para que as implicações em relação à dedicação de comprometimento e foco, sempre alinhados à ética nas relações. É essencial que os colaboradores possam compreender que a redução de jornada não implica de forma alguma em uma redução de comprometimento ético.

Além disso, é essencial que o compliance reforce para os colaboradores que a redução de jornada também não implica em redução de direitos, bem como não viabiliza de forma alguma comportamentos autoritários de superiores, de forma que o Canal de Denúncias da empresa continua a funcionar normalmente para todos.

A jornada 4×3 tem atraído os olhares de muitos empregadores e tem ganhado muitas empresas adeptas a novidade. De fato, o modelo promete a redução de stress, um ambiente empresarial mais leve, maior produtividade e melhor qualidade de trabalho.

No entanto, para colher os benefícios do modelo é necessário o comprometimento de colaboradores e líderes em relação a dedicação e foco, aspectos que dever diretamente ligados a ética empresarial e aos valores corporativos.

Gabriela Diehl é advogada e cofundadora da Be Compliance. Pós-graduada em Direito Empresarial pela FGV-SP, com especialização em Direito Empresarial Internacional pela Université Montpellier e Direito Internacional e Direitos Humanos por Harvard. 

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