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STF decide suspender repasses do orçamento secreto

Para advogadas, modelo afronta princípios como impessoalidade e igualdade

11 de novembro de 2021

Marcello Casal JrAgência Brasil

Por 8 votos a 2, o STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu, na tarde desta quarta-feira (10), o julgamento que decidiu pela suspensão dos repasses das emendas do chamado orçamento secreto.

As ações, apresentadas ao STF em maio, questionavam a validade das emendas do relator, ferramenta usada por deputados e senadores para reverter parte do orçamento a suas bases políticas.

Advogadas especializadas em Direito Penal e Constitucional concordam que o atual modelo de liberação de verbas parlamentares precisa ser revisto.

Para a criminalista Cecilia Mello, advogada do Cecilia Mello Advogados, que atuou como juíza federal por 14 anos no TRF-3, embora as emendas parlamentares tenham um arcabouço legal bastante restritivo, o problema surgiu com a Lei 13.898/2019 (LDO de 2020), que acrescentou as chamadas “Emendas RP9” (Identificador de Resultado Primário 9), reiteradas pela LDO de 2021 e previstas no projeto de LDO de 2022, que autorizam a inclusão de novas despesas primárias discricionárias a serem indicadas exclusivamente pelo relator por meio de emendas.

“Com isso, o relator pode livremente indicar órgãos e entidades federais em que serão investidos bilhões de reais. E, na sequência, parlamentares poderão apontar para esses mesmos órgãos e entidades que foram premiados onde gostariam que os recursos fossem empregados. A decisão sobre esses pedidos feitos por parlamentares, em suma, sobre quem será atendido, passa a ser destes órgãos e entidades que integram o Poder Executivo. Surge nesse contexto a possibilidade de o Executivo literalmente escolher quais serão os parlamentares que serão contemplados, com uma verdadeira rasteira no genuíno interesse público e nos direitos dos cidadãos”, diz Cecilia.

A advogada explica que, anteriormente à RP9, deputados e senadores indicavam o destino das suas emendas, com direito ao mesmo valor, pouco importando se do governo ou da oposição. “Agora, há uma escolha de ganhadores pelo Executivo, sem qualquer avaliação técnica de necessidade e/ou preponderância social. Um verdadeiro balcão de negócios que favorece desvios, compra de votos, corrupção e abuso de poder”, defende.

Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em Direito Público pela FGV, não vê como indevida a interferência do Poder Judiciário no tema. “O mérito da presente questão tem, proporcionalmente, uma relevância significativa, pois remete aos recursos públicos arrecadados e que devem ser utilizados na satisfação das necessidades públicas. Trata-se, pois, de uma intervenção necessária com o objetivo de resgatar a transparência daquelas emendas, isto é, quanto e para onde são destinados os recursos públicos que compõem o orçamento do governo federal”, sustenta.

A especialista destaca ainda que as emendas do relator constituem uma parte do orçamento da União, cuja destinação é definida pelo Relator Geral da Lei Orçamentária Anual (LOA).

“A confecção da LOA pelo Poder Executivo obedece, obrigatoriamente, as regras e critérios previstos em legislação atinente ao tema, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, por razões óbvias: a receita pública (arrecadação de dinheiro dos contribuintes) terá que ter uma utilidade exclusivamente pública. Em outras palavras: a despesa pública planejada terá um caráter transparente (notório conhecimento de onde será aplicada) e oportunamente publicizada, para que se tenha certeza de sua destinação. A partir do momento em que aquelas emendas do relator tenham um destino obscuro, sem qualquer identificação do parlamentar que as requereu, o valor recebido, assim como, para onde serão aplicadas, constata-se inequivocamente, uma grave afronta aos princípios da Administração Pública, como, a impessoalidade, e particularmente, a igualdade (quando aqueles recursos são distribuídos de forma a privilegiar determinados parlamentares, em detrimento de outros), evidenciando a ausência da equidade, sem falar da moralidade administrativa e da sua legalidade”, conclui.

 

Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

 

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