Notícias

Portaria do governo sobre estupro é alvo de críticas

Entidades entendem que a medida constrange e causa sofrimento à vítima

4 de setembro de 2020

A Portaria 2.282 do governo federal, publicada em 27 de agosto, determina que, em casos em que houver indícios ou confirmação do crime de estupro, o médico do SUS (Sistema Único de Saúde) responsável pelo procedimento deve acionar a Polícia. Entidades entendem que a medida constrange e causa sofrimento à vítima.

Ouvida pelo JuriNews, Mayra Malloffre Ribeiro Carrillo, criminalista, sócia do Damiani Sociedade de Advogados, afirma que a recente alteração do artigo 225 do Código Penal tornou os crimes contra a dignidade sexual de ação penal pública incondicionada.

“A obrigatoriedade do médico em comunicar todo e qualquer crime de ação penal pública já estava prevista na lei das contravenções penais, em seu artigo 66, inciso II. Tudo isso reflete a mudança de postura do Poder Legislativo no sentido de que o crime sexual afeta interesse não somente da pessoa ofendida, mas também da sociedade, que busca a punição dos agentes do delito de estupro.”

Cecilia Mello, sócia do Cecilia Mello Advogados, especialista em direito administrativo e ex-juíza federal no TRF-3, lembra que a notificação compulsória já fazia parte do nosso ordenamento jurídico e a portaria não inovou e tampouco trouxe novos procedimentos que pudessem melhorar as condições das vítimas.

“Parece-me ser o caso de a sociedade repensar toda a legislação. O que precisa ficar absolutamente claro é que essas disposições dizem respeito ao crime eventualmente praticado pelo agressor, ao delito de violência sexual sofrido pela vítima. Esta poderá, inclusive e em muitos casos, não vir a necessitar do procedimento de aborto legal, mas sim do atendimento médico e multidisciplinar que lhe é assegurado”, afirma.

Cecilia explicou a evolução da legislação sobre o tema. “O Decreto nº 7.958/2013, valendo-se da Lei nº 8.080/90 (Lei do SUS), regulamentou a matéria e fixou diretrizes para o atendimento humanizado às vítimas de violência sexual no âmbito da Segurança Pública e do SUS. O seu art. 4º elenca os procedimentos a serem observados pelos profissionais da rede do SUS, destacando-se o “preenchimento da Ficha de Notificação Compulsória de violência doméstica, sexual e outras violências” (Inc.VI)”.

Segundo ela, a Lei nº 12.845/2013, editada posteriormente ao referido decreto, disciplinou detalhadamente o atendimento médico e multidisciplinar das vítimas de violência sexual pelos hospitais do SUS, incluindo a facilitação do registro da ocorrência e encaminhamento ao órgão de medicina legal e às delegacias especializadas para fins de identificação do agressor e comprovação da violência. “A Lei nº 13.931/2019, que alterou o artigo 1º da Lei nº 10.778/2003, determinou a notificação compulsória, pelos serviços públicos de saúde e privados, no prazo de 24 horas, à autoridade policial, de casos com indícios ou confirmação de violência contra a mulher. Essa medida já era prevista na Lei nº 10.778/2003, porém sem fixação de prazo e sem expressa inclusão da hipótese de existência de apenas indícios”, afirma.

 

Notícias Relacionadas

Notícias

Audiências virtuais em processos trabalhistas causam polêmica

Com ressalvas, advogados elogiam a possibilidade de sessões virtuais

Notícias

Regra que posiciona membro do MP ao lado do juiz é constitucional

Para a maioria do STF, proximidade física não influencia os julgamentos