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Equiparação de injúria racial ao racismo é avanço, mas não resolverá problema

Advogados defendem reformas estruturais e maior conscientização da população

23 de maio de 2022

O Senado aprovou na quarta-feira (18) o Projeto de Lei 4.373/2020, que pretende equiparar o crime de injúria racial ao de racismo. A matéria segue agora para análise da Câmara dos Deputados.

Em outubro do ano passado, por 8 votos a 1, o STF (Supremo Tribunal Federal) já havia se manifestado nesse mesmo sentido, entendendo que o crime de injúria racial é espécie do gênero racismo – portanto, imprescritível, conforme o artigo 5º, XLII, da Constituição.

Consultados pelo Estadão, advogados avaliaram a aprovação do Projeto de Lei (PL) como um avanço, mas não a solução para o problema.

Silvio Almeida, sócio do Warde Advogados e professor visitante da Universidade de Columbia (EUA), lista três elementos vitais no projeto. “O primeiro é a incorporação das posições dos tribunais superiores (STJ e STF) que entendem a injúria racial como uma das manifestações possíveis dos crimes de racismo, portanto, inafiançável e imprescritível. O segundo é a possibilidade que o projeto traz de oferecer respostas específicas para casos de racismo, tais como o racismo disfarçado de humor, o racismo ‘recreativo’, o racismo no esporte e o racismo religioso. O terceiro é o fato de que o Senado incorporou no projeto as contribuições científicas da comissão de juristas instituída pela Câmara dos Deputados para pensar reformas antirracistas na legislação nacional”, comenta Almeida, que foi relator da Comissão de Juristas instituída pela Câmara e que propôs esse PL. 

Ana Manuela Nepomuceno, advogada criminalista e gestora do Núcleo de Violência de Gênero do escritório Daniel Gerber Advogados, avalia o PL como um verdadeiro “divisor de águas”, considerando que o tipo penal de injúria racial, na forma em que se encontra hoje, “não se mostra suficiente para repreender as condutas racistas que presenciamos diariamente”. “A injúria, enquanto crime de baixa pena, que possibilita fiança e só é processada quando a vítima, muitas vezes acuada e desacreditada, manifesta interesse, torna a persecução penal um tanto quanto frouxa e reafirma o sentimento de impunidade. É notório que, se não há educação suficiente que quebre essa cadeia perene do preconceito estrutural, que as leis sejam aprimoradas e aplicadas corretamente sem alternativas mais brandas e ineficazes que só fazem distanciar a tão sonhada igualdade”, analisa.

André Damiani, criminalista, sócio fundador do Damiani Sociedade de Advogados, destaca que o Brasil é um país “nitidamente marcado pela questão do racismo estrutural”. 

“A equiparação da injúria racial ao crime de racismo é um verdadeiro avanço. Hoje, em diversas situações, pode haver equívoco na interpretação do tipo penal cometido e o agressor, em decorrência, sair impune. A situação mais comum que retrata essa dubiedade é quando um delegado de Polícia aponta o crime de racismo, mas o juiz entende que é injúria racial. O juiz extingue a ação por falta de provas ou por tipificação equivocada, bem como a eventual incidência da prescrição”, exemplifica.

Damiani faz a ressalva de que, mesmo com o avanço da equiparação entre os delitos, o problema não será totalmente solucionado. “É imprescindível que se realize uma reforma estrutural de mentalidade da nossa sociedade. Isto porque, não é apenas criando tipos penais ou enrijecendo as interpretações existentes que erradicaremos nossas mazelas. A criminalização deve andar de mãos dadas com a conscientização e educação da sociedade”, conclui.

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