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Advogados apontam efeitos de decisão sobre Moro

Especialistas explicam diferenças entre suspeição e competência

25 de março de 2021

FABIO RODRIGUES POZZEBOM / AGÊNCIA BRASIL

O resultado do julgamento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que considerou o ex-juiz Sergio Moro parcial na condução do processo do ex-presidente Lula no caso do triplex do Guarujá, terá várias consequências para o futuro da Lava Jato.  Vale lembrar que, anteriormente, o ministro Edson Fachin já havia decidido que a 13ª Vara Federal de Curitiba, que tinha Moro como titular, era incompetente para processar e julgar o petista.

À ConJur, advogados analisaram os últimos acontecimentos e projetaram seus possíveis desdobramentos.

A advogada constitucionalista Vera Chemim explica que “a declaração de parcialidade de um juiz ou a declaração da sua suspeição, em razão de sua conduta parcial na condução dos processos, remete à total nulidade do ponto de vista material”.

“Isto é, anula a sentença de condenação e resgata a inocência do réu, uma vez que, a depender inclusive, da natureza de cada prova colhida no âmbito do processo, ela também sofrerá nulidade, a menos que seja reconhecida como uma prova independente, sem a mácula da parcialidade do juiz”, diz Chemim.

Já a declaração de incompetência, segundo a especialista, é uma questão de natureza processual e remete ao reconhecimento, de acordo com a legislação processual civil, de que um determinado magistrado não detém a competência territorial para processar e julgar um determinado caso, ou ainda, uma ação civil ou penal.

Chemim destaca, ainda, que os demais processos em que Lula figura como réu não foram atingidos pela decisão da 2ª Turma do STF. “Contudo, existe uma forte possibilidade de a sua defesa fazer um novo pedido junto ao Supremo, para que as três ações penais restantes tenham o mesmo desfecho, por terem sido conduzidas por Moro”, diz.

Fernanda Tórtima, sócia do Bidino & Tórtima Advogados e mestre em Direito Penal pela Uni-Frankfurt, na Alemanha, também entende que o julgamento da 2ª Turma tem como consequência apenas a anulação do processo do triplex do Guarujá. “Já a condenação do caso de Atibaia foi anulada por decisão monocrática que considerou a 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba incompetente. Contra esse acórdão ainda há recurso da PGR pendente de apreciação. De qualquer forma, como o ex-presidente não está condenado por nenhum outro tribunal de segunda instância, ele está agora elegível”, opina Tórtima.

O constitucionalista e criminalista Adib Abdouni afirma que a defesa do petista “deverá provocar o Poder Judiciário e demonstrar que a postura processual de Moro mostrou-se de forma equivalentemente parcial, a fim de buscar a extensão dos efeitos anulatórios”.

Já para Marco Antônio Marques da Silva, advogado criminalista, professor de Processo Penal na PUC-SP e sócio do Warde Advogados, Lula não possui mais nenhuma condenação.

“A análise da ausência de imparcialidade do juiz Sergio Moro deu-se no julgamento da ação penal do caso ‘triplex do Guarujá’ e, a princípio, a decisão limita-se a este caso. Há outras quatro ações penais em andamento na Justiça Federal de Brasília e São Paulo em desfavor de Lula e outra condenação, confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no ‘caso Sítio de Atibaia’. Esta, entretanto, foi anulada por decisão do ministro Edson Fachin em razão da incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba. Assim, a não ser que o Plenário venha a rever a decisão do ministro Fachin, Lula não possui nenhuma condenação, nem mesmo em primeira instância”, diz o prof. Marco Antônio.

Caso outros réus da Lava Jato também optem por buscar a suspeição de Moro, Rodrigo Faucz Pereira e Silva, advogado criminalista e professor de Processo Penal da FAE, diz que o Judiciário deverá analisar caso a caso. “Cada defesa precisará provar, naquele caso em concreto, se ocorreu algum tipo de conduta indevida que comprove a parcialidade de Sergio Moro”, explica.

Perda de objeto em questão

Segundo Faucz, a decisão de Fachin sobre a incompetência de Moro e a da Turma não são conflitantes, mas sim complementares. “Independentemente da decisão sobre a incompetência de Moro, ainda assim a decisão sobre a suspeição é válida. Ademais, a suspeição foi reconhecida com base em elementos fáticos e não pode ser simplesmente afastada em um julgamento que não discutirá o mérito da parcialidade do ex-juiz”.

O professor Marco Antônio sustenta que a decisão de Fachin sobre a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba foi mais ampla do que a tomada pela 2ª Turma. “Isso se deu porque a decisão de Fachin anulou não apenas o caso ‘Triplex do Guarujá’, analisado na suspeição do juiz Moro pela 2ª Turma, mas também os casos ‘Sítio de Atibaia’, ‘sede do Instituto Lula’ e ‘doações ao Instituto Lula’. Assim, prossegue o interesse no julgamento do habeas corpus que discute a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, ficando prejudicado o caso ‘Triplex do Guarujá’, porque já anulado em razão da suspeição de Moro”, explica.

Adib Abouni também não vê perda de objeto. “A decisão de Fachin não será prejudicada haja vista que o reconhecimento da incompetência é o que fundamenta e justifica o deslocamento dos processos ao juízo natural de Brasília. Tem, entretanto, no plano da eficácia anulatória, alcance menor, já que o reconhecimento da incompetência não implica declaração de nulidade de todos os atos judiciais praticados, mas, tão-somente, dos atos decisórios proferidos pelo juízo incompetente, enquanto que a constatação da parcialidade resulta na nulidade do processo penal, incluindo-se aí os atos probatórios”.

Opinião semelhante tem o advogado criminalista Daniel Bialski, mestre em Processo Penal pela PUC-SP e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim.

“O Plenário do Supremo terá que analisar a decisão do ministro Edson Fachin. A partir disso, teremos um norte: se o Plenário vai ou não referendar a interpretação dada. Isto é muito importante porque também vai direcionar de quem será a competência para analisar o processo, que foi anulado pelo Supremo – e os outros. Pode ser mantida a prevenção  do juiz de Curitiba, mandar o caso para  Brasília ou até  São Paulo. É preciso examinar todo o contexto, dessa forma direcionando a amplitude ao menos desse primeiro reconhecimento de nulidade declarado. Na minha interpretação, essa amplitude é total. Todos os atos e decisões são nulas até pela ‘teoria do fruto da árvore envenenada’”, comenta Bialski.

A PGR já defendeu que a decisão da 2ª Turma também vá ao Plenário. Sobre essa possibilidade, Bialski diz que “o Plenário é soberano para decidir se mantém ou não a decisão sobre o reconhecimento de suspeição e sobre todas essas questões envolvendo nulidade”. “Os demais processos do ex-presidente Lula permanecem parados aguardando o julgamento do agravo regimental interposto pela Procuradoria, o que ainda deverá ser analisado pelo Pleno do STF”, conclui.

Adib Abouni acredita que dificilmente o Plenário mudaria o resultado. “É improvável que haja maioria suficiente para reforma, tendo em vista a exuberância dos fatos notórios que demonstram a atuação parcial do juiz”, opina.

Aproveitamento de provas

Sobre o aproveitamento de provas, os advogados avaliam que nada poderá ser aproveitado. 

“As provas produzidas sob a condução do juiz parcial são inaproveitáveis, por cuidar-se, apesar de haver entendimento diverso, de nulidade absoluta, de modo que deverão ser refeitas sob o crivo da imparcialidade”, pondera Abdouni.

Por sua vez, Marco Antônio Marques da Silva afirma que a ação penal retorna ao seu estado inicial, conforme disciplina o art. 564, I, do Código de Processo Penal. “Em relação à decisão do ministro Fachin que reconheceu a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, apenas os atos decisórios serão anulados, cabendo ao juiz competente a decisão sobre a convalidação dos atos instrutórios, nos termos do art. 567 do Código de Processo Penal, o que, aliás, restou consignado na decisão do ministro Edson Fachin”, conclui o professor.

Rodrigo Faucz Pereira e Silva sustenta que “não há aproveitamento dos elementos que foram produzidos sob a presidência de um juiz parcial”.

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

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